Corrupção e retrocessos na terra do Cruzeiro - Anselmo Vasconcelos
                
            
O Brasil tem sido ao longo da sua história - como nação independente - terreno fértil às maracutaias e negociatas de toda sorte. Destacados personagens em nosso meio foram e continuam sendo protagonistas de ações profundamente deletérias à sociedade. Como as nossas leis são extremamente imperfeitas, os malfeitores quase nunca pagam pelos seus crimes como deveriam. Assim sendo, saem e voltam à ribalta com inacreditável rapidez. Não é sem razão, aliás, que alcançamos a vergonhosa 107ª posição – a pior em nossa série histórica – no ranking da corrupção elaborado pela ONG Transparência Internacional (TI) – instituição que monitora 180 nações nesta particular dimensão.
Tão lamentável resultado decorre do afrouxamento – quando não ocorre total anulação – das punições aos criminosos do colarinho branco, que sempre seduziram as almas moralmente tíbias assentadas em posições-chave nas instituições públicas, e obtendo, assim, vantagens ilícitas. Esses indivíduos – geralmente empresários ou destes representantes – são muito eloquentes na arte de corromper os decisores de plantão. Desse modo perverso conseguem se insinuar com eficiência e obter a aprovação de leis e medidas nefandas.
Em paralelo, segundo relatório da Oxfam do Brasil, aproximadamente 60% da riqueza dos bilionários advém de fontes como herança, favoritismo e corrupção ou poder de monopólio. Ou seja, não contentes em desfrutar de imensa riqueza, os corruptores sempre desejam mais e mais, e tudo fazem para ampliar o seu patrimônio. A ganância desses indivíduos não tem limites. Não é por outra razão, cabe lembrar, que Jesus foi tão incisivo ao nos alertar para os perigosos desafios da acumulação de riqueza: “Porque é mais fácil entrar um camelo pelo fundo de uma agulha do que entrar um rico no reino de Deus” (Lucas 18:25).
Posto isto, vale também recordar que foi com grande esperança que a sociedade brasileira abraçou as iniciativas da chamada Operação Lava-Jato – verdadeiro marco no combate à corrupção no país. Eventuais exageros à parte, pela primeira vez em nossa história os poderosos foram colocados no cárcere a mancheias. Desse modo, empresários e políticos tiveram as suas vidas devassadas pelos membros do Ministério Público, e os seus podres revelados. Corruptos e corruptores foram, enfim, expostos e os seus esquemas milionários vieram à tona.
Parecia que o Brasil – que naquele momento serviu de referência mundial – estava finalmente debelando esse carcinoma que lhe impedia o progresso e a justiça. Ledo engano. As forças contrárias reagiram vigorosamente através da contratação de bem-sucedidos advogados pagos a peso de ouro e que exploraram com maestria todas as supostas deficiências processuais. Como resultado iniciou-se uma perseguição aos membros da justiça, libertação de condenados e o cancelamento de multas, entre outras medidas sombrias. Em síntese, uma inesperada e decepcionante virada de mesa aconteceu, e todo o esforço empreendido pela Lava-Jato vem sendo sistematicamente derruído.
A propósito, outra notícia altamente preocupante relativa a esse episódio marcante foi divulgada recentemente. Ou seja, a TI, acima citada, denunciou o desmonte do combate à corrupção a Comissão da Organização dos Estados Americanos (OEA) - principal fórum regional para o diálogo, análises de políticas e sobre tomadas de decisões com relação aos assuntos do Hemisfério Ocidental. Mais especificamente, a denúncia feita à Comissão Interamericana de Direitos Humanos enfocou a decisão do ministro Dias Toffoli, do STF, que anulou todas as provas do acordo de leniência da Odebrecht e afetou processos em diversos países da América Latina.
O pedido da audiência foi liderado pela TI e pela Federação Internacional para os Direitos Humanos (FIDH) e ainda contou com a participação de capítulos nacionais da TI e de organizações afiliadas à FIDH da Colômbia, Guatemala, República Dominicana e Venezuela, além do Brasil, obviamente. Conforme a TI, “O objetivo da audiência foi alertar a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA sobre os profundos e variados impactos negativos da corrupção sobre os Direitos Humanos e solicitar ao órgão que atue sobre essa relação de forma sistemática”. A premissa norteadora da iniciativa é de que haja atuação mais intensa da CIDH que possa levar à “responsabilização dos países por situações de impunidade sistêmica, como a que atualmente prevalece na América Latina sobre o caso Odebrecht (Novonor), considerado o maior caso de suborno transnacional da história”.
Portanto, tal iniciativa coloca o nosso país numa delicadíssima posição, considerando os desdobramentos do caso, sem falar no tratamento dado a ele pela nossa justiça, particularmente do juiz em questão, autor das anulações. Para a TI, “Mais do que nunca, as decisões de alguns ministros do Supremo (e a omissão de outros), garantindo impunidade generalizada de corruptos poderosos, são, hoje, uma ameaça real ao Estado democrático de direito no Brasil”.
Desse modo, é com extremo pesar que notamos o Brasil despencar em consagrados índices internacionais que medem a saúde da democracia no planeta. Do ponto de vista espiritual, os envolvidos nesse escândalo não parecem estar muito preocupados com o seu amanhã. As imortais lições de Jesus aparentemente não lhes penetram na acústica da alma. Com efeito, parece que não vivem e nem se miram no Cristo e seus exemplos – muito menos cooperam pelo estabelecimento do seu reino neste mundo –, único caminho para a construção de uma verdadeira civilização.
Pobres criaturas que um dia haverão de prestar contas da sua lamentável administração a Deus!

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