A busca da felicidade

Era um entardecer radiante de sábado, com um calor agradável dos 24 graus centígrados, neste final de janeiro, na bela cidade de Curitiba, capital do Paraná. Especifico a zona onde reside esta que lhes escreve – o Jardim Botânico. Esse recanto quase central da cidade é uma área muito boa para morar e viver, dentro do grande e antigo bairro do Cajuru. Da janela de minha sacada posso ver, bem pertinho, o antigo Convento de Freiras e escola-internato para meninas, o Colégio Cajuru, que com certeza muitos leitores do nosso jornal O Imortal vão lembrar.

O mapa das grandes cidades se amplia rapidamente, e aparecem situações que de um momento para o outro nos chama a atenção, como inéditas, mas que vamos nos acostumando no dia a dia. Uma dessas situações é ver diariamente pessoas passando puxando carrinhos de recicláveis de tamanha altura, que não tem como não sentir piedade pelos trabalhadores desse ofício de recicladores. Passam o dia coletando nas ruas do centro onde podem pegar nos lixos os recicláveis, sem serem molestados por muitos, como já aconteceu de eu mesma presenciar, e serem enxotados como animais, ao tentarem cortar as caixas de papelão, na esquina aqui perto do Mercado Municipal. Desde então, tenho ainda mais respeito por esses irmãos e irmãs nossos, que estão fazendo o possível para se alimentar, sobreviver com dignidade, levando nossos lixos de consumos diários, enquanto nossa mesa é farta da alimentação, boas compras, e descartamos no lixo o que para eles é fonte de ajuda.

Semana passada, ao perceber um desses carrinheiros que estavam na esquina lá embaixo na rua do Moinhos Anaconda, desci com as caixas de papelão que eu havia desmontado, para facilitar ao carrinheiro pegar e colocar na sua carroça.

Levei um pedaço de bolo de fubá com goiabada, que a Lea, amiga e vizinha que reside a três quarteirões daqui, havia trazido para mim, e perguntei ao casal de catadores se queriam um pedaço de bolo.

Ele apressadamente respondeu:  Que felicidade. Minha mãe sempre fazia esse bolo de fubá para mim e para os meus sete irmãos, quando pequenos. Vi o brilho no seu olhar, e pensei que, com tão pouco, ele já mostrava o sabor da felicidade.

Aproveitei a deixa e perguntei a eles: Vocês são felizes?

Meus amigos leitores, me surpreendi e fiquei emocionada com a resposta daquele casal, ambos um pouco molhados com a chuva que tinham tomado pouco tempo atrás, e ouvi: A gente não tem do que se queixar. Temos um barraco na comunidade, onde houve uma invasão numa área verde, e conseguimos puxar um gato de eletricidade, e temos uma televisão, e nossos filhos vão à escola da comunidade, e conseguimos nos manter com os recicláveis que levamos para a cooperativa. Sempre há uma boa alma como a senhora nos dá algo e levamos aos nossos filhos. E mostrou a sacolinha com o pedaço de bolo.  

Pedi a eles que esperassem um pouco, subi novamente, peguei os pacotes de bolachas que já deixo no armário para as netas quando chegam, dei o que eu tinha, e perguntei a idade das crianças.

Ficaram de passar em outra oportunidade para pegar algumas roupas que vou organizar com amigos e doar a eles, pois para eles a felicidade está em viver, em comer um pedaço de bolo que lhe recordou a infância; e da árdua vida que levam, não ouvi uma reclamação, mas a sensação que tive é que eram dois espíritos que levavam luz à comunidade, em algum resgate ou missão espiritual, que com certeza estão muito mais à frente do que nós, que temos tanto e ainda reclamamos algumas vezes.

Assim, nesta coletânea de crônicas que escrevo já faz 24 anos, vou meditando no meu dia a dia, seja aqui no Brasil ou seja nas terras de além-mar, onde vivi por quase 27 anos. 

Elsa Rossi, depois de viver por 25 anos no Reino Unido, onde presidiu por 12 anos a federativa espírita britânica, reside na cidade de Curitiba, Paraná.



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