Como nasceu, segundo seu autor, a obra Novos Casos de Jerônimo Mendonça

Natural de Ituiutaba (MG), onde também reside, Nicola José Frattari Neto é doutor em educação, sociólogo e atua profissionalmente como supervisor escolar. Nas lides espíritas, participa do Centro Espírita Seareiros de Jesus, de sua cidade. Tendo convivido com Jerônimo Mendonça, apresenta-nos nesta entrevista mais reflexões a respeito dessa convivência, sobre a qual lançou, pela Casa Editora O Clarim, o livro “Novos Casos de Jerônimo Mendonça”:

Seu recente livro sobre Jerônimo Mendonça traz, como o próprio título da obra indica, casos de sua convivência com a notável personalidade de Jerônimo. De que forma avalia os frutos dessa convivência nos dias atuais?

Convivi com Jerônimo Mendonça em minha juventude. Ia para sua casa durante as tardes auxiliá-lo no recebimento das visitas e nos cuidados, para que sua mãe e suas irmãs pudessem descansar um pouco. Mas, na verdade, ficava eu ali calado e ouvindo o amigo o dia todo. Como vocês sabem, Jerônimo era tetraplégico, cego e sofria problemas cardíacos gravíssimos. Ainda assim atendia os sofredores que o procuravam diariamente, viajava por todo o Brasil fazendo palestras e divulgando seus livros, fazendo campanhas para a construção e manutenção de suas obras sociais. Acompanhar Jerônimo foi uma escola. Ele tinha o conhecimento espírita na mente e o amor no coração. Aprendíamos o tempo todo. Qualquer assunto para Jerônimo era perfeito para iniciar discussões e explicações sobre os mais variados tópicos abordados pela Doutrina Espírita. Era aprendizado o tempo todo. Acompanhá-lo também me transformou o íntimo. Ver aquele homem acamado e sofrendo dores o dia todo, sorrindo, recitando poesias, cantando e orientando as pessoas que o buscavam era algo grandioso. Lembro-me de Jerônimo em todos os momentos da minha vida. No trato com as pessoas, em meus processos de sofrimento, frente aos problemas da vida, nas alegrias com os amigos... Foi um professor que me evangelizou a alma com seus exemplos. O mais bonito é recordar sua humanidade, pois, como ele mesmo dizia, Jerônimo não era "santo", era um homem comum que também errava, porém possuía um desejo enorme de dar o melhor de si a todos.

Selecione um caso bem marcante de suas observações e aprendizados com Jerônimo.

Certa vez, ao terminar o culto em sua residência, o que ele fazia com a família e amigos todos os dias às 19h, eu e mais dois visitantes carregamos sua cama para o Centro Espírita Seareiros de Jesus, pois haveria ali uma reunião pública. A casa de Jerônimo ficava em frente do centro. Assim que pegamos sua cama, um leito anatômico construído exclusivamente para ele, naqueles poucos minutos gastos para atravessar a rua, Jerônimo disse-nos, sem que ninguém esperasse: "Devemos aguardar o momento exato para iniciarmos uma vida sexual ativa. Aguardar um momento adequado, com maior maturidade e com uma pessoa equilibrada. Muitos iniciam vida sexual muito jovens e tornam-se vítimas de situações perigosas como abortos, violência, exploração, sofrimento... Devemos aguardar o momento certo." Todos ficamos em silêncio ouvindo aquelas palavras que mais pareciam uma orientação espiritual, inclusive porque o assunto durante o culto era outro completamente diferente. Como podem perceber, ele aproveitava cada minuto para transmitir algo bom ao semelhante. 

Como foi o critério de organização da obra que publicou? Muitos casos em realidade vieram de sua própria memória. Esse processo foi difícil?

Nunca imaginei escrever um livro sobre Jerônimo. Alguns anos atrás, não me lembro ao certo a data, resolvi escrever algumas passagens que tive com ele, coisas que ouvi e que vi, para guardar e recordar ao longo da vida. Foram poucas páginas escritas. Alguns anos depois o amigo Ala Michel me apresentou ao sr. Apparecido Belvedere e a Rosi Siqueira, num congresso espírita. O sr. Apparecido, como todos sabem, era naquele momento um dos dirigentes de O Clarim, em Matão, SP. O amigo Ala Michel me apresentou a ele como alguém da terra de Jerônimo. O sr. Apparecido começou a falar sobre a amizade que possuíam, sobre quando foi a Ituiutaba e quando Jerônimo foi até Matão. No meio da conversa agradável, ele me perguntou se eu tinha um livro escrito sobre Jerônimo – era como se ele soubesse dos meus escritos guardados. Confesso que me assustei, pois ele foi bem enfático. Eu disse que sim. Então pediu-me que enviasse a ele o mais rápido possível, pois iria publicar. Voltei para casa muito feliz, comecei a recordar-me rapidamente de mais histórias vividas com Jerônimo e, quando senti esgotar, me veio a intuição de conversar com outros amigos e colher outros casos. Assim foi feito. No mesmo momento as pessoas se apresentaram e sua família, sem saber que eu escrevia um livro, me cedeu o arquivo de fotos de Jerônimo. Tudo isso de forma espontânea e intuitiva. Era como se o livro estivesse pronto na Espiritualidade e os Espíritos estivessem materializando a obra por nosso intermédio.

Considerando sua mediunidade, como é sua percepção de Jerônimo, pelo fato de havê-lo conhecido em vida?

Convivi com Jerônimo por três anos; ele desencarnou em 1989. Apesar de eu ser apenas um adolescente tímido que o visitava, ele tinha um carinho comigo, como na verdade tinha com todos. Anos depois que ele partiu para o plano espiritual, um dia a querida amiga Dona Teresinha Carvalho Vilela, chamada por ele de "Mestra", confidenciou-me que no dia em que conheci Jerônimo, logo que fui embora, ele disse a ela que cuidasse de mim. Disse que ele não teria perna para correr atrás de mim e que eu precisaria dela como uma mãe. E realmente, dona Teresinha me orientou nessa vida como uma verdadeira mãe, me puxava a orelha e me fez ficar firme no trabalho espírita até que eu amadurecesse mais. Anos mais tarde, em 1997, comecei a trabalhar na mediunidade e ele passou a enviar-me mensagens, sonetos, poemas e orientações pela psicografia, o que faz até a atualidade. Jerônimo continua um grande trabalhador, pois há comunicações dele por intermédio de vários médiuns por todo o Brasil e exterior. Orienta vários grupos espíritas e ajuda os médiuns insuflando-os ao trabalho com o Cristo. 

Após o lançamento do livro, você participou de muitas lives, com palestras e entrevistas. O que mais o marcou nesses momentos de convivência virtual?

Eu já vinha desenvolvendo um trabalho de palestras, programas na Web Rádio Fraternidade e divulgação de mensagens de Jerônimo desde 2016, com maior ênfase. O livro "Novos Casos de Jerônimo Mendonça" foi lançado no início da pandemia, no dia 31 de março de 2020. Então, passamos às lives, uma vez que as casas espíritas estavam em sua maioria fechadas. Encontramos muitos amigos de Jerônimo nesse momento, pois com as lives chegamos a lugares bem distantes no Brasil e no exterior. E também foi graças a esses encontros que conhecemos pessoas maravilhosas, amigos que nos fortificam até hoje e creio que iremos seguir pela vida. Um fato interessante ocorreu, pois recebemos uma orientação logo que a pandemia começou. Os Espíritos amigos nos disseram que encontraríamos com um grupo afim de amigos do Espírito de Yvonne Pereira, aquela que foi grande médium quando encarnada e autora do livro Memórias de um Suicida. Realmente, em pouco tempo conhecemos muitas pessoas ligadas a essa irmã, principalmente no estado do Rio de Janeiro. Encontros de luz e amizade que seguirão em trabalho para toda a vida. 

E agora você está preparando um novo livro? Comente sobre isso.

Recebemos alguns romances espíritas psicografados e que vêm sendo publicados pelo Clube do Livro Espírita do Brasil, pela Editora Auta de Souza. Temos o "Promessa de Jesus" pelo Espírito Alexandre Ivanovich, o "Estrela da Manhã" pelo Espírito Henrique Kruger e o mais recente "Donatello" pelo Espírito Eustáquio e que foi lançado recentemente, em 2022. Para 2023 será lançado o livro "Nos Albores da Imortalidade", autoria de Jerônimo Mendonça, contando um pouco de sua biografia do outro lado da vida, logo após sua desencarnação. Em breve os leitores poderão acompanhar essa bela história do nosso querido amigo.

E como foi durante a psicografia?

A psicografia de romances possui suas características, como se apresenta em O Livro dos Médiuns. Yvonne do Amaral Pereira também disserta um pouco em seus livros sobre a feitura do romance pela psicografia. Os Espíritos tendem a impressionar o médium por vários canais mediúnicos a fim de que ele compreenda bem a história, as cenas, as personagens e seus diálogos, para que esse possa exprimir o que desejam no papel. Requer muita dedicação, pois é um processo mais prolongado, chegando o recebimento a vários meses ou anos. Como ressalta dona Yvonne em suas obras, o trabalho seguido ao recebimento é o da correção, que deve ser minuciosa e não se preocupar com publicações rápidas. O médium deve trabalhar durante essa parte checando informações históricas, caso haja, e principalmente perceber se os ensinamentos espíritas estão sendo conduzidos de forma clara, correta e abrangente. Faz-se necessária a correção ortográfica e ainda que outras pessoas sejam convidadas a ler o texto em primeira mão, para opinarem e auxiliarem o médium na percepção se a obra realmente já está pronta para publicação. É um trabalho minucioso que requer dedicação, disciplina, perseverança, humildade, estudo e trabalho. Segundo Allan Kardec, na Revista Espírita, os romances têm grande poder de alcance entre as massas, por isso pode ser um excelente meio de divulgação doutrinária quando oferecido ao público com seriedade e compromisso.

Algo mais que gostaria de acrescentar?

Como nos dizia Jerônimo, é nos momentos de crise, dor e sofrimento que realmente introjetamos o Espiritismo em nós. Essas horas são como um quadro negro e nós somos o aluno chamado à frente para responder a lição. Em todo momento difícil em nossa existência, temos que nos perguntar o que Jesus faria nesse momento, e buscarmos as melhores soluções com o Cristo. Nem sempre conseguimos acertar totalmente, mas se conseguimos dar o nosso melhor, isso já é um grande passo. O Espiritismo está aí para todos nós, para nos auxiliar a melhorar sentimentos. Jerônimo dizia que, se já temos uma semana de Evangelho, já podemos ser melhores... Imagine aqueles que estão há mais de vinte, trinta anos na casa espírita, ouvindo o Evangelho semanalmente. Se elegermos o Cristo como nosso modelo e guia, se acreditarmos que a vida verdadeira é a do espírito, se compreendermos que Deus realmente é o nosso Pai, não cairemos em armadilhas de apego e orgulho. Então, vamos devagar, mas sempre adiante. Como dizia o querido Chico Xavier, há dias que só conseguimos caminhar um passinho, em outros dias conseguimos correr. 

Suas palavras finais.

Somente os agradecimentos pela oportunidade de falar desse amigo de todos que é Jerônimo Mendonça. Convido a todos, mais uma vez, para lerem o livro "Novos Casos de Jerônimo Mendonça" e também a procurarem o romance "Nos Albores da Imortalidade", pelo Clube do Livro Espírita do Brasil, editora Auta de Souza. Obrigado!



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