Alcides Maya
Alcides Maya, jornalista, político, contista, romancista e ensaísta, nasceu em São Gabriel-RS, em 15 de outubro de 1877, e faleceu no Rio de Janeiro-RJ em 2 de outubro de 1944.
Seu pai, Henrique Maya de Castilho, era funcionário público federal e de origem citadina. O vínculo com o pago e o sentimento gaúcho, que marcariam a ficção do futuro escritor, vieram-lhe através da linha materna. Carlinda de Castilho Leal, sua mãe, era filha de Manoel Coelho Leal, dono da estância de Jaguari, no município de Lavras do Sul-RS.
Alcides Maya passou a infância na estância de Jaguari, cenário de muitas de suas páginas regionalistas, sobretudo no romance Ruínas vivas, que é, de certo modo, a visão nostálgica da estância avoenga. Antes de ter concluído os estudos primários, Alcides foi levado para Porto Alegre, onde fez os estudos de humanidades. Em 1895, quando contava 18 anos, ingressou na Faculdade de Direito de São Paulo. A sua verdadeira vocação, porém, eram as letras e o jornalismo, por isso abandonou o curso de Direito. Retornando a Porto Alegre em 1896, entregou-se à prática do jornalismo militante, atividade que ele exerceria ao longo de toda a vida.
No jornalismo distinguiu-se sempre pela preocupação eminentemente cultural e pelo engajamento político. Iniciou em A Reforma, órgão federalista, mas logo foi "lutar ao lado dos batalhadores da República". A partir de 1897, passou a integrar a redação de A República, órgão da dissidência republicana, e chegou a ocupar a direção do jornal.
Em 1903, Alcides Maya fez sua primeira viagem ao Rio de Janeiro, onde seu nome já era bem conhecido. A partir de então, passou a viver e a desenvolver atividades, alternadamente, ora no Rio de Janeiro, ora em Porto Alegre. Homem de caráter e refinado esteta, era o tipo de intelectual talhado para sentir-se à vontade na capital do país. Seu gauchismo sem jaça era a expressão da autenticidade do seu nacionalismo atuante.
A partir de 1905, passou a militar na imprensa carioca, profissionalmente, colaborando em O País, O Imparcial, Correio da Manhã e Jornal do Commercio. Assinava artigos também com o pseudônimo Guys. Em 1908, voltou para Porto Alegre, levado por uma motivação bastante ambiciosa: a fundação de um matutino, o Jornal da Manhã. Durou apenas um ano, mas ficou na sua coleção uma parte valiosa do acervo jornalístico de Alcides Maya. De volta ao Rio, viveu os melhores anos de sua carreira jornalística e literária. Em 1910, publicou seu único romance, Ruínas vivas, que compôs com os livros de contos Tapera (1911) e Alma bárbara (1922) sua trilogia regionalista, que reflete a poesia dos pampas, buscando no passado as raízes do seu povo. Outros grandes momentos de sua carreira deram-se em 1912, com a publicação do ensaio Machado de Assis (algumas notas sobre o humor), e, no ano seguinte, com a sua entrada na Academia Brasileira de Letras, como o primeiro rio-grandense a ter ingresso na Casa de Machado de Assis. Por essa época, era o bibliotecário do Pedagogium.
Representou o Rio Grande do Sul na Câmara dos Deputados, no período legislativo de 1918 a 1921. Embora integrado na representação do Partido Republicano, a sua atividade parlamentar se fez sentir pela preocupação com os problemas da educação e cultura. De 1925 a 1938, residiu em Porto Alegre, com breve incursão ao Rio, decorrente de sua participação no movimento revolucionário de 1930. Lá dirigiu o Museu Júlio de Castilhos, até se aposentar, e colaborou no Correio do Povo. Levado por uma inquietação de toda a vida, retornou ao Rio, onde viveu os últimos anos de sua vida (1938-1944), escrevendo para o Correio do Povo e frequentando a Academia Brasileira de Letras quando podia.
O “médium” Alcides Maya
Uma faceta pouco conhecida do grande escritor Alcides Maya é de que ele foi bastante exaltado entre os espíritas, quando tomaram conhecimento de alguns fenômenos por ele manifestados.
Positivista empedernido, o ensaísta gaúcho, no entanto, foi excelente médium de efeitos físicos, o que, aliás, o deixava aborrecido, pois os fenômenos o colocavam em situação desagradável perante os amigos. Os fatos vividos por Alcides Maya revestem-se de comicidade devido à contundência dos mesmos.
A pedido do próprio Alcides Maya, o poeta Leal de Souza mudou-se da Rua Senador Vergueiro, onde morava, para a pensão da Rua Buarque de Macedo, 52, onde vivia o ensaísta. Alegara Alcides Maya que estava há tempos sofrendo uma crise nervosa e precisava de um amigo ao seu lado. Instalado na pensão, Leal de Souza, em seu quarto, logo no primeiro dia sentiu os cabelos se arrepiarem. Eram dez horas da noite e estava ele no quarto, com a porta semicerrada. De súbito, alguém bateu forte, insistente. Despreocupado, Leal disse, cordialmente: "Entre!" E ninguém entrou; pelo menos, aparentemente. Mas, atento, ouviu certos passos se dirigirem da porta até o ponto em que se encontrava. Como nada visse pensou: “São passadas no aposento ao lado”.
E, como tivesse muita certeza, tratou de fechar a porta do corredor. De volta ao seu aposento, tornou a ouvir pancadas, agora na porta que dava comunicação ao quarto vizinho, onde estava instalado Francisco Marcondes, então presidente da Assembleia do Estado do Rio. Não acreditando em fantasmas, saiu Leal de Souza, mais uma vez, do quarto e foi procurar o incômodo vizinho, a fim de pedir silêncio. Mas, Francisco Marcondes não se encontrava na pensão... “Bem", pensou Leal, "ele sacudiu a porta e em seguida saiu...” – e deitou-se, sem mais delongas.
Foi quando, para grande espanto seu, viu a própria cama levantar-se do solo. Rápido, deu um pulo. E o leito, que era de ferro, desceu, então, suave ao assoalho. Tornou a deitar-se e, de novo repetiu-se o fenômeno. "Estou sofrendo dos nervos!", pensou. E correu até o quarto de Alcides Maya e contou-lhe o ocorrido, pedindo ao ensaísta gaúcho que, no dia seguinte o acompanhasse até um especialista de moléstias nervosas. Mas Alcides Maya o sossegou, confessando que nos quatro cômodos daquele segundo andar ocorriam, diariamente, tais fenômenos. E disse: "Mandei chamar você por causa deles. Queria saber se você, sem ser avisado, os constataria". No dia seguinte, um dos inquilinos mudou-se da pensão e em seu quarto instalou-se um inglês, à noite. Mas, pela manhã, o inglês, com os olhinhos muito arregalados, fez as malas, pagou a conta e despediu-se apressado. Tendo Francisco Marcondes, por sua vez, achado melhor regressar à sua fazenda, ficaram no segundo andar apenas Alcides Maya e Leal de Souza, cujos quartos eram separados por dois aposentos.
Eram nove horas da noite e Leal de Souza se encontrava deitado, lendo uma obra, quando sentiu uma desagradável sensação de frio no pé. Ao procurar a coberta para aquecê-lo, viu, estupefato, “uma coluna de luar leitoso a alvejar sobre a cama”. Olhando firme, observou que o “luar” foi tornando-se consistente e, aos poucos, tomou a forma de uma figura humana. E, não sabendo como agir, Leal de Souza, trêmulo, abandonou o quarto.
Interessante é que esses fenômenos ocorriam, quase sempre, às duas horas da tarde e geralmente iam até a madrugada. E eram atestados por pessoas estranhas que, curiosas, iam à pensão, mas nada sabiam explicar.
Certa vez, no quarto de Alcides Maya tomavam mate-chimarrão um pastor protestante, Leal de Souza e o ensaísta gaúcho. Trocavam ideias, naturalmente sobre a bebida do Rio Grande do Sul, quando o sofá, sem aviso prévio, pôs-se a subir, devagarinho, com Alcides em cima; como um "Saci", Alcides pulou ao chão: e o sofá continuou no ar, desafiando a lei da gravidade. Então, todos se puseram a discutir o fenômeno. "Isto é o efeito de um abalo sísmico", disse o pastor, mas tão nervoso, que não pensou que, se fora um abalo, o sofá não devia continuar no espaço, é evidente. "Não pode ser abalo", discordou Alcides Maya, "um tremor de terra sacudiria os outros móveis e abalaria as paredes!" Quando o sofá, enfim, pousou sobre o assoalho sem provocar ruídos, o pastor protestante saiu-se com esta: "Meus amigos, só há uma explicação para o caso. Este sofá não se levantou. Nós tivemos um momento de alucinação!" E, assim, o ingênuo pastor explicou, definitivamente, a ação dos espíritos no plano físico.
É indiscutível que o excelente médium de efeitos físicos era Alcides Maya. Quando ele e Leal de Souza desocuparam os quartos, novos inquilinos vieram e nada de anormal se verificou. Todavia, passados dois meses, Alcides regressou à pensão e, nessa mesma noite, foi um desastre, para os inquilinos incautos. Em seus quartos os objetos tremiam, luzes brilhavam dentro da escuridão, pancadas sacudiam as portas; uma autentica sessão de efeitos físicos! E o resultado foi cômico; alucinados com o que viam e ouviam, os inquilinos, em trajes menores, se puseram a descer a escadaria, procurando a porta da rua.
Infelizmente, Alcides Maya, talvez por temer sua reputação literária (era da Academia Brasileira de Letras) não deu notícia de outros casos que serviriam de instrumento aos espíritos. Quer dizer: preferiu a hipotética e frágil imortalidade acadêmica à imortalidade contundente dos espíritos. Quanto a Leal de Souza, a partir dessa data passou a estudar as obras de Allan Kardec, tornando-se espírita dedicado.
Fonte: Diamantino Fernandes Trindade, professor universitário; Livro- Escritores fantasmas de Jorge Rizzini pg. 61
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